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08 maio

Novo Hamburgo: Um tapa de humildade na cara do futebol milionário

Diante do abismo econômico e cultural entre os times grandes e pequenos, o Novo Hamburgo conseguiu a façanha de ser Campeão Gaúcho de 2017.

Na loucura do dia a dia da em que um precisa ser melhor que o outro, muitas vezes passamos por cima de valores morais esquecidos em razão da necessidade de se vencer a qualquer custo. Isso vai desde a propina dos políticos até o descaso com um pedinte na rua. Enfim, tá no nosso modus operandi do “manual de sobrevivência do cotidiano brutal do brasileiro”.

Então não é por acaso que o futebol – essa página constantemente rasgada do manual, mas que fica pendurada na cozinha – é um esporte enlouquecedor para dois grupos antagônicos: quem obviamente é louco por ele ou para aqueles insanos que se recusam a fazer parte disso.

Portanto, nada mais “futebol” para nos dar um exemplo de humildade e um sopro de esperança.

Se você não é do Rio Grande do Sul, provavelmente nunca ouviu falar do Esporte Clube Novo Hamburgo. O clube tem raízes na região metropolitana de Porto Alegre e na cidade culturalmente identificada com imigrantes alemães homônima a ele.

São mais de cem anos de História e nenhum título de expressão no cenário brasileiro e regional. Motivo suficiente para afastar qualquer criança ou adulto desse “pequeno” time para escolher entre os “gigantes” Grêmio e Internacional.

Nada demais e nenhuma crítica a isso. Entendo que ser Grêmio ou Internacional é ser gaúcho ou gaúcha. E a distância construída historicamente entre os clubes da capital para os situados no interior chega ao limite de gremistas e colorados acharem o Campeonato Gaúcho um estorvo e que ambos deveriam abandonar de vez essa competição.

Arrogância, empáfia, insolvência, petulância… Acrescente aqui o seu sinônimo para descrever esta posição na qual até ontem eu estava incluído.

As preocupações dos “grandes” (pelo menos no discurso externo) são com lesões de jogadores tratados a pão-de-ló, tão distantes da realidade quanto os clubes do interior estão da dupla Gre-Nal. Os atletas se tornam profissionais que precisam ser punidos com concentrações antecipadas e protegidos da famigerada mídia.

São uma minoria “rica” e presa no cotidiano de treinos físicos, técnicos e táticos exaustivos para promover egos de dirigentes e suspiros de felicidade (e tristeza) do sócio-torcedor de poltronas acolchoadas em novíssimos estádios e arenas de futebol.

Diante desse abismo econômico e cultural, o Novo Hamburgo conseguiu a façanha de ser Campeão Gaúcho de 2017.

Um clube no qual a folha salarial de jogadores e toda comissão técnica não pode ser paga com um salário de um atleta reserva de um clube “grande” brasileiro. Um clube que o “foco” é a Série D de futebol; que seu centroavante ganha memes nas redes sociais por estar “acima do peso”; e, pasmem, mesmo sendo a melhor campanha do campeonato, sem perder nenhum jogo para a dupla Gre-Nal, não pôde jogar a partida final no seu estádio devido à falta de capacidade.

O Nóia (como também é conhecido carinhosamente por uma minoria de fiéis do clube) jogou aquele futebol considerado “feio” nas partidas decisivas, longe do glamour de qualquer tiki-taka brasileiro. O treinador Beto Campos montou uma equipe pragmática e eficiente em contra-ataques e bolas aéreas ofensivas; robusta nas linhas de marcação e com “pegada”.

E acima de tudo isso, o Nóia entrou em campo com muita vontade de vencer. Não para escrever história (um singelo argumento talvez usado como fator motivacional no pré-jogo), porém, principalmente, para sobreviver – tal qual aquele “manual” lá de cima.

Então, por exemplo, pouco importa o destino dos jogadores e do técnico campeão. Talvez eles consigam até entrar no seleto rol de profissionais presos à dura rotina de receber volumosos contratos de imagem.

Mas pode ser também que o Novo Hamburgo continue jogando em campos duros de grama rala com uma centena de torcedores acostumados com arquibancadas de concreto úmido. E quem sabe ainda veremos algum problema de desvio do dinheiro com eventuais novos patrocinadores.

Tudo isso é provável que aconteça e não seria surpreendente para nenhum de nós.

Entretanto, o tapa de humildade na cara do futebol milionário dado pelo Novo Hamburgo é atemporal. Ele é mais do que um exemplo de superação descrito em manjadas narrativas esportivas. Acima de tudo, é um sopro de esperança para quem ainda acredita na capacidade humana de quebrar paradigmas dentro do falido sistema do futebol brasileiro.

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